quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

VISITA AO CEMITÉRIO




Resolvemos que iríamos passear pelo cemitério.
Cemitério antigo, o mais antigo da cidade. Guardava restos dos importantes. Os que não o eram, repousavam em valas comuns.
Alí não!
Só gente de renome. 
A verdade é que de pessoas restavam só os nomes, carregados de tradição, pois o resto se diluíra em pó resguardados em caixas de madeiras, que chamamos caixões, pagos bem caro, por causa do ébano, mógno , das alças  de bronze, sei mais o que e para que.
O fato é que ficávamos embevecidas com a arquitetura das tumbas, de mármore, granito, cimento.
Túmulos com estátuas de bronze forjado, lindas mesmo. A que eu mais gostava de ver era a da saudade: Uma mulher com um véu cobrindo-lhe a face e com um ramo de rosa num dos braços e uma mão que despejava uma rosa sobre a lápide.
Alguma vez deparávamos com um túmulo em ruína. De quem seria? 
 Que desleixo. Poderíamos pensar.
 Não, não era desleixo. É que provavelmente os daquela família tinham ido todos. Não tinha mais ninguém para ornamentar e sobretudo para pagar as tachas para prefeitura. 
Por visitante, nada mais que uma lagartixa acinzentada e afoita que arriscava aparecer naquela hora do dia.
Aquela pedra rachada, tombada para a direita com algumas ervas daninhas tentando, a duras penas, ornamentarem  o que sobrava daquela tumba, com apenas um nome RANGEL... Rangel o que ? Rangel só? Sabe-se lá. 
Com certeza ali descansava os restos de um alguém que vivera em tempos de coreto, nos idos dos 800, que usufruíra da moda e dos encontros no parque da cidade. Que comprara algum algodão doce  cor de rosa, a lembrar uma nuvem de poente, cujo neto, vestido de marinheiro, devorava com muita pressa,para que que a espuma rosa não perdesse a vida com o sopro da brisa.
Passeamos muito, minha amiga e eu. Tiramos as mais loucas  e fantásticas conclusões que nossa imaginação poderia criar.
Passeamos entre perdas, saudades, desilusões, amores e paixões. Rimos a bom rir, de tudo que imaginávamos e vez por outra chegamos a ter pequenas emoções.
Deixamos o quarteirão dos mortos na cidade dos vivos e fomos para  nossas casas sem culpa, sem receio de ter ofendido algo sacramentado, apenas recebemos a noite com nossas cabeças e macios travesseiros de plumas.

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